[Resenha] [Série] AJ and the Queen



        SINOPSE NETFLIX: A drag queen Ruby Red viaja pelo país num trailer velho e acaba encontrando uma ajudante inesperada no caminho: AJ, uma carona de 10 anos de idade.



            

            Criada por Michael Patrick King e pelo ator e transformista americano RuPaul, “AJ and the Queen” é uma série da Netflix, lançada em janeiro de 2020, e estrelada pelo próprio RuPaul e pelo talento mirim Izzie Gaspersz.

            Após ter problemas financeiros e amorosos, o transformista e louco por limpeza Robert Lee resolve sair de Nova York em um trailer velho para atravessar os Estados Unidos fazendo shows em boates como a drag queen Ruby Red. Tendo como destino Nova Orleans, pretende concorrer a um grande prêmio de performance para, quem sabe, reconstruir a sua vida. O que ele não contava, entretanto, era se deparar com uma inusitada carona: AJ, uma criança de dez anos rebelde e negligenciada, que morava no apartamento do andar acima do seu.

            Sem conseguir pagar o aluguel, a mãe, a prostituta e usuária de drogas Brianna Douglas, é despejada do imóvel e AJ precisa viver com uma família adotiva. Mas não por muito tempo. Com o plano de chegar ao Texas para viver com um suposto avô, que lhe manda cartas e dinheiro a cada aniversário, resolve fugir do lar temporário e se abrigar no antigo apartamento, agora completamente vazio. Para sobreviver, usa toda sua esperteza, tanto para conseguir dinheiro e comida quanto para se defender dos perigos das ruas. E é exatamente nesse momento que o seu caminho cruza com o de Robert.

           Com cenas muito divertidas e extremamente tocantes, a amizade improvável vai ganhando muitas cores, talvez mais vivas até do que as que existem no arco-íris do mundo de Robert. Desiludido, mas muito gentil, amoroso e até ingênuo, o transformista acaba acolhendo a criança e, a cada parada dessa viagem cheia de aventuras, movidas a muitas risadas, vão levando uma mensagem leve e muito bonita de alegria, amor, tolerância e aceitação.

                AJ sofre e atribui seu sentimento de abandono e rejeição à mãe viciada, enquanto Robert, que convive diariamente com preconceito racial, sexual e, até mesmo profissional – já que ser drag é uma expressão artística –, descobre-se tentando pouco a pouco, mesmo sentindo-se tão rejeitado quanto, suprir a carência afetiva da criança e, de certa forma, cumprindo um papel muito relevante em sua vida.        

    AJ narra alguns episódios dizendo que a história era sua e que tudo havia começado porque precisava de dinheiro. No entanto, o sentimento de respeito, carinho e proteção de ambas as partes vai roubando as cenas a cada episódio e transformando a história mais do que coletiva. Entre um show transformista e outro, o espectador é capaz de sentir toda a relação fraternal que vai sendo construída a cada lição que aprendem juntos e também a cada experiência compartilhada e travestida de mensagens carinhosas ao público.

     Mesmo ouvindo que “drag queens vão para o inferno!”, Robert precisa encarnar Ruby Rose para ter coragem. Mas até mesmo “Ruby” sente durante a viagem, que precisa mais do que as palavras da Oprah, dos figurinos da Cher e da Diana Ross e das performances exageradas para sentir-se como no hino gay “I will survive” (Eu sobreviverei). Tanto a personificação de Ruby quanto Robert ou mesmo AJ ou nós, cada um dos espectadores, compreendemos que não trata-se apenas de coragem. Trata-se da importância de se “ter quem nos empurre para frente quando desejamos voar mais alto”. Trata-se de sentir-se importante, de sentir-se querido, de sentir-se amado.

    Infelizmente, a série só possui uma única temporada (o anúncio do cancelamento foi feito pelo próprio ator nas redes sociais), contando com apenas dez episódios cheios de sentimento. É uma pena. Mas o que aquece o coração é saber que, mesmo que o espectador não possa acompanhar, tem a certeza de que a estrada da vida continua (mesmo a fictícia) e que os protagonistas aprenderam e também deixaram uma grande lição, expressada através das palavras de AJ: “família é quem cuida da gente”.

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