[Resenha] Minha sombria Vanessa - Kate Elizabeth Russell


Sinopse: 
Elogiado por Gillian Flynn e considerado um dos grandes livros de 2020, o romance de estreia de Russell explora as dinâmicas psicológicas de um relacionamento entre uma adolescente e seu professor.

Em 2000, Vanessa Wye é uma estudante solitária de ensino médio. Talentosa e com o sonho de ser escritora, Vanessa diz não se importar de ficar sozinha, principalmente quando seu professor de inglês, Jacob Strane, um homem de 42 anos, começa a prestar atenção nela, elogiando seu cabelo, suas roupas e lhe emprestando alguns de seus livros favoritos ― como Lolita, de Nabokov. Antes que Vanessa perceba, os dois embarcam em uma relação e a jovem acredita que o professor a ama e a considera especial.
Mais de uma década depois, uma ex-aluna acusa Strane de abuso sexual, e Vanessa começa a questionar se o que viveu foi realmente uma história de amor ou se não teria sido ela também uma vítima de estupro. Mesmo depois de tantos anos, Strane ainda é uma presença constante em sua vida. Como ela seria capaz de rejeitar o que considera seu primeiro amor? Alternando entre presente e passado, o livro justapõe memória e trauma ao entusiasmo de uma adolescente descobrindo o poder do próprio corpo. Instigante e impossível de largar, o livro retrata com maestria a adolescência conturbada e suas consequências, para refletir acerca de liberdade, consentimento e abuso. Escrito com intimidade e intensidade assustadoras, Minha Sombria Vanessa capta brilhantemente os costumes culturais em transformação que guiam nossos relacionamentos e a própria sociedade.


Autora: Kate Elizabeth Russell 

Editora: Intrínseca

Páginas: 432 

ALERTA DE GATILHOS!!

 Minha sombria Vanessa foi uma leitura perturbadora. Em muitos momentos precisei parar e enxergar quem era a real vítima, porque a construção é feita para mostrar todas as faces que existem dentro de uma relação de pedofilia. Senti vergonha de mim mesma e vou explicar porque.

 Vanessa Wye era uma jovem deslocada em uma escola nova na qual não tinha muitos amigos e acabou se envolvendo em uma história conturbada que iria ecoar em sua vida para sempre.

 Como uma jovem reservada, inocente e inexperiente, Vanessa é incapaz de notar os caminhos desconexos que sua vida toma quando a atenção de seu professor, Jacob Strane, acaba sendo direcionada para si. Ele parece enxergar muito mais nela do que ela mesma. Através de elogios e promessas veladas, Jacob faz com que Vanessa caminhe diretamente em sua direção em troca de toda atenção que ela não está acostumada a ter.

 Jacob é um homem adulto, solteiro e extremamente manipulador. Ele é inteligente e consegue captar perfeitamente as fraquezas de suas vítimas para que dessa forma, consiga o que quer sem que isso pareça errado.

 A narrativa é perturbadora. A história é dividida entre momentos do presente, onde temos uma Vanessa de 30 anos cheia de traumas mas que recusa ver-se como uma vítima, e por isso, recusa enxergar as agressões que sofreu e como isso a atingiu. O tempo todo a Vanessa adulta quer se mostrar forte, e para isso ela precisa acreditar que tudo o que aconteceu em sua adolescência foi consequência de suas escolhas e atitudes. Foi uma história de amor.

 Toda a experiência traumática deixou profundas marcas. Vanessa se torna uma mulher que se entrega a vícios e tende a diminuir outras vítimas que passaram ou passam pelo mesmo que ela por não achar que tenha sido assim tão absurdo.

 Vivemos em uma sociedade que isso acontece constantemente. Se uma mulher sofre uma agressão, no lugar do foco ser o agressor, o foco se torna a vítima e em como ela teve culpa por ter sido agredida.

 Minha vergonha vem disso. Em muitos momentos da leitura, eu pequei e culpei Vanessa. Culpei porque achei que ela tinha perfeita capacidade para não ter se deixado levar. Que ela era inteligente o suficiente para não permitir-se ser manipulada da forma que foi, mas a verdade é que ela era a vítima e fim. As pessoas responsáveis por zelar por sua segurança não estavam presentes para isso. Sua própria família fez vista grossa e o foco se tornou ela estragar a carreira de um professor tão brilhante.

 Todos os seus traumas e humilhações foram deixados de lado, pela escola, por seus amigos, por seus familiares e ela se afundou em culpa. A forma que encontrou de lidar com tudo isso? Acreditar em uma história de amor que todos queriam impedir.

 É asqueroso pensar que isso é a realidade de muitos jovens por aí. Muitas vezes eles se afundam dentro de si porque sabem que as chances de serem ridicularizados por uma denúncia são maiores do que as chances de terem justiça.

 Minha sombria Vanessa traz uma reflexão crua e cruel: Por que no lugar de proteger a sociedade busca primeiro justificativas contra a vítima? Qual o sentido de questionar a vítima? Uma pessoa que sofreu o abuso não deveria ser deixada em paz e todo o bombardeio de questionamentos não deveria ser direcionado para o agressor?

 O livro foi uma leitura indigesta, mas necessária.

 Vocês já tinham ouvido falar do livro? O que acham de livros com uma temática mais pesada?

“Mesmo que ele tenha feito alguma coisa, não pode ter sido tão ruim assim, ou O que nós poderíamos ter feito para impedir? As desculpas que inventamos para os outros são absurdas, mas não são nada em comparação com as que criamos para nós mesmos.”

 

Um comentário

  1. Oi, Vanessa.
    A sua resenha foi impecável. Confesso que esse tipo de leitura não me atrai por parecer as das mais nuas e cruas, aquelas que não há para onde correr. Mas confesso que nasceu uma curiosidade imensa.
    Obrigada!

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